quinta-feira, 6 de maio de 2010

A Santa Igreja Católica Apostotólica Romana - um (impossível) exercício de lógica

Nessa semana o língua comprida do arcebispo de Porto Alegre resolveu dar com a língua nos dentes. Disse que "a atual sociedade é pedófila" e entra em contradição óbvia. Em primeiro lugar, se essa tal Sociedade é pedófila, deveria ser processada. Tentei procurar a sociedade no orkut, facebook, twitter, google, etc. e não encontrei nenhum perfil, nenhuma biografia na wikipedia. Despois dessa profunda consulta no que há de mais confiável quando se trata de disponibilização do conhecimento, tentei buscar uma outra forma de raciocício. Se a sociedade é uma estrura, talvez o sarcedote tenha pensa que ela tem uma estrutura pedófila, realmente não creio, ao que me consta, ao menos, há uma grande rejeição à pedofilia em nossa sociedade (ao menos na fachada). Poderíamos falar que a sociedade grega na antiguidade tivesse uma estrutura pedófila, afinal, a pedofilia não era doença, pelo contrário, tinha caráter pedagógico. Se não acreditam em mim, leiam O Banquete (Symposion) de Platão.

Mas o bacana de batina completou "então, facilmente as pessoas caem nisso". Facilmente? Eu não poderia pensar que é tão facilmente assim, pois deve dar um certo trabalho fazer algumas coisas escondido. Aliás, quando falo em escondido certemente chego ao problema da pedofilia na Igreja Católica. A questão não é, de maneira alguma a existência de padres que sejam pedófilos. Se esse fosse o problema, poderia haver algum sentido no que o arcebispo falou. A questão é que a Igreja, ao invés de agir contra esses casos, silenciou, acobertou e dissimulou. 
Vamos brincar de lógica e fazer alguns silogismos. Se considerarmos verdadeira a proposição do Dadeus que "a atual sociedade é pedófila" e que facilmente as pessoas caem  no que a sociedade é, "então, facilmete as pessoas caem nisso (na pedofilia)". O silogismo é válido. Proponho uma analogia: "a atual sociedade é corrupta", "facilmente as pessoas caem no que a sociedade é", "então, facilmente as pessoas caem na corrupção". O segundo silogismo é valido e não é difícil aceitar que a sua conclusão seja também verdadeira. 

Então faço uma pergunta: devemos deixar de recriminar os corruptos?

Eu acho que não e duvido alguém se manifestar publicamente contrário ao que digo. Então, não creio que seja perseguição à Igreja, que tanto bem fez à humanidade ao queimar bruxas que enfeitiçavam esse mundo por ordem do demônio, ao matar judeus por usura depois de pedir dinheiro emprestado a eles e não devolver, por excomungar pessoas que se envolvem no aborto de uma garota de nove anos estuprada, por dar o sacramento da extrama unção para os índios infieis antes de serem assassinados, por se calar frente ao nazismo, dentre tantas outras obras de caridade feitas ao longo da sua história. A questão é que, moralmente, não podemos aceitar uma instituição acoberta os crimes dos seus membros.

Mas aí o Dom  disse que "quando a sexualidade é banalizada, é claro que isso vai atingir todos os casos. O homossexualismo é um caso. Antigamente não se falava em homossexual. E era discriminado. Quando começa a [dizer] que eles têm direitos, direitos de se manifestar publicamente, daqui a pouco vão achar os direitos dos pedófilos". Aí ficou difícil argumentar contra o discurso desse cidadão. Mesmo assim eu tento. Ele ainda disse que "nós sabemos que o adolescente é espontaneamente homossexual. Menino brinca com menino, menina brinca com menina. Só depois, se não houve uma boa orientação, isso se fixa. Então, a questão é: como vamos educar nossas crianças para o uso da sexualidade que seja humano e condizente?"
Uma das manifestações mais humanas a respeito da sexualidade é buscar prazer através dela e numa relação homessexual é isso acontece de forma mais pura. Ao contrário do que prega a Igreja (ao menos oficialmente para o público leigo), sexo com fins estritamente reprodutivos e heterosexual é o que há de mais animal e selvagem nas manifestações da sexualidade, algo bestial, puro instinto, desprovido de desejo, de cultura e de humanidade.

É claro que a perversão também é humana e caminha lado a lado com o desejo, mas nisso a (tentativa de) castidade tem um papel muito mais importande do que a homossexualidade. Sobre isso deveria se discutir um pouco mais na igreja, fazer um "mea culpa" e parar de tentar culpar os outros, como sempre fez.

terça-feira, 12 de janeiro de 2010

2010 maquiavélico

Estamos em pré-temporada do ano de eleições – em pré-temporada de 2010 mesmo até o carnaval – e talvez esse seja um ano mais interessante para encher as páginas desse blog. Para começar bem o ano – ou me adiantar a ele – começo com uma polêmica. Claro que com o número de leitores do blog não vai chegar a ser uma polêmica plim plim, mas como esses textos não passam de materialização das minhas masturbações intelectuais, sigo em busca do meu primeiro orgasmo filosófico público do ano: falemos de mensalões e direitos humanos.

Não quero discutir o conteúdo do 3o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), mesmo que eu tenha de lançar mão de alguns exemplos, se o presidente leu ou não antes de assinar o decreto, nem se quem o critica tão vorazmente o leu, ou se os mensalões do PT, DEM e do PSDB são verdadeiros ou, só intriga da oposição. É um pouco difícil definir o tema desse post, pois se eu definir como PMDB, é amplo demais e ainda restritivo, se falar de oposição é restrito demais, mesmo que amplo. Ainda não decidi o título do texto, se fosse Montaigne seria algo do tipo: “Da impossibilidade do PMDB ser oposição, ou da facilidade em eleger-se com apoio do PMDB e da dificuldade para governar o Brasil sem o seu apoio”.

No capítulo IV de O Príncipe, Maquiavel diz que os principados são governados de dois modos: “ou por um príncipe de quem são servidores todos os outros, que, na qualidade de ministros por sua graça ou concessão, o ajudam a governar aquele reino, ou por um príncipe e barões que detêm a sua posição não pela graça do senhor, mas pela antiguidade da sua linhagem”. Tais barões gozam de muito respeito das populações locais e “poderão abrir-te caminho para dentro do Estado e facilitar a tua vitória. Porém para conservá-lo, enfrentarás infinitas dificuldades.

No ano passado o Lula disse que se Cristo quisesse governar o Brasil, teria de fazer aliança com Judas e a Veja não gostou da comparação. Lanço aqui a minha primeira ideia: se Maquiavel fosse brasileiro, no lugar de barão usaria a palavra cacique. Tomando isso por certo, não justificarei mais. A política brasileira é dominada por barões, ou caciques, que, independentemente de quem for governo gozam de grande poder nos seus redutos eleitorais. Nota-se aqui que, apesar de ser uma república, a nossa política comporta-se de forma muito parecida com o segundo modo de governo de principados descrito no parágrafo anterior.

É evidente que há mais fatores para uma eleição, mas essa análise simples já mostra a importância que o apoio do PMDB tem para as eleições presidenciais, mas isso não sai de graça. Aliás, custa muito caro, custa todo o governo e a governabilidade e é nesse momento que o partido fatura com desde Ministérios até cargos de quinto escalão do governo. Sempre sob a ameaça de não ter apoio, de ter a maioria do congresso fazendo oposição e leiloando os votos da próxima eleição.

Dentre outras instituições que se comportam como barões temos também a Igreja. Se não me engano, um bispo da CNBB disse que o projeto é “anti-democrático” (talvez por ousar deixar que as mulheres decidam sobre o seu próprio corpo) e que “daqui um pouco vão querer derrubar o Cristo Redentor”. E para fazer coro, os milicos reclamaram do “revanchismo” do projeto, por propor justiça a torturadores da dita dura.

Isso é democracia, ou deveria ser, pois há debate público. Ao menos teria que me decidir se oposição é bom ou ruim, já que reclamei da falta de oposição no Brasil, mas deixo esse tema para uma outra oportunidade. A questão que coloco é: quais são as condições de possibilidade de um governo no Brasil que se relacionam com o PMDB?

Responde Maquiavel: “O conquistador, que não é capaz de satisfazê-los ou esmagá-los, perderá o Estado na primeira ocasião que se apresentar.”
O Imperador Napoleão comenta: “Absolutamente certo.”
Collor tentou esmagá-los.
Lula pode satisfazê-los?

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Genes adolescentes

Um dia desses fui almoçar num bar de uma região que é famosa pelos seus hambúrgueres. Eu tinha fome e vontade de comer algo que pudesse chamar de comida, mas fiquei com a prata da casa. Por falar em prata da casa, vi um cartaz muito interessante que dizia: "Contrate um adolescente enquanto ele ainda sabe tudo". Muito irônico e revelador de uma ideia geral de que os adolescentes pensam saber muito, mas não sabem nada. Mas ao menos uma coisa eles sabem: que "não pediram para nascer".

Não ter pedido para nascer não é privilégio dos mais jovens, isso passa pela infância e até mesmo um velhinho de mais de cem anos, satisfeito com a vida que levou, poderia dizer como última frase "não pedi para nascer". Essa é uma verdade que ninguém pode negar, mas só os adolescentes verbalizam e o fazem pela situação que enfrentam: buscam mais liberdade porque o mundo os trata quase como adultos e os pais tentam controlá-los justamente por serem quase adultos. A verdadeira consequência disso é que os filhos não devem nenhuma satisfação aos pais e estes não podem exigir nada da prole.

Os filhos não devem satisfações aos pais, pois deles nada recebem além de contigências. Assim, não haveria nada a agradecer, mas antes a reclamar (como faz a grande maioria dos adolescentes) do que se recebe dos pais. A começar pelo corpo, que, apesar de não ser culpa deles, o temos desta ou daquela forma, porque nossos pais são como são e se quiséssemos culpar um deles, ainda poderíamos dizer que poderia ter escolhido outro(a) para ser pai ou mãe. Se alguém  usar óculos e sonhava em ser piloto de avião, está aí uma contigência a reclamar. Por outro lado, podería ter uma visão perfeita e a mãe sonhasse que fosse engenheiro, e patrocinaria todos os estudos para isso. Num terceiro caso, alguém com visão perfeita e a mãe sonhasse com o filhinho piloto de avião e a dúvida: quem quer o piloto, o filho ou a mãe?

De sua parte os pais não têm nenhum direito a exigir algo de seus filhos. Só o fato de gerá-los dá a eles contingências com as quais terão de lutar toda sua vida para constituirem-se como seres humanos. Pensando nesta responsabilidade talvez ninguém tivesse coragem de matricular um filho numa escola de música antes que ele pedisse isso, ou mesmo nem teria filhos. E é nessa relação que o assunto pode ficar sério.

Dois temas que estão na moda são meio ambiente (mudança climática) e genética (intervenção na genética humana, sobretudo). Nos dois casos estamos diante de situação que envolve esse diálogo assimétrico entre relações. Assim como os pais constituem os filhos e lhes dão todas as contigências, as nossas decisões de hoje constituem de certa forma o ser humano das próximas gerações. Gostaria de me concetrar um pouco no tema da eugenia, mas ficarei em apenas uma reflexão.

Há diferença fundamental entre um pai aumentar a possibilidade que seu filho tenha um corpo propício para jogar futebol e matriculá-lo numa escola de futebol aos 3 anos de idade? Imagino um rapaz de corpo perfeito, pernas com músculos que mesclam força e velocidade na medida certa sem a necessidade de exercícios físicos que uma pessoa normal precisaria, dizendo ao seu pai que gostaria de frequentar um psicólogo para que lhe ajuda a aumentar a sua concentração, pois não consegue estudar para prestar o vestibular de medicina. Se ele estiver um pouco mais irritado, talvez diga para o seu pai, não pedi para ter um corpo perfeito! Ou talvez ele dissesse: "se tu tivésses me amado, terias melhorado o gene da minha inteligência".

O conhecimento da genética traz mais uma responsabilidade a todos, no momento em que se sabe não há mais como escolher isso. Não há como se livrar da nossa condenação à liberdade e usar ou não o que sabemos é uma escolha que implica responsabilidade e os adolescentes sempre lembrarão os seus pais disso.

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Política e existencialismo II: A era dos projetos

Hoje o Barack Obama ganhou o prêmio Nobel da paz. Até o Lula mandou um telegrama parabenizando o surpreso agraciado. Muitos elogios de diversos lados, exceto dos republicanos, que talvez acreditem que o "little Bush" (Buchinho, em português) o mereça.

Brincadeiras, elogios e críticas a parte, tudo nos leva a crer que estamos num mundo onde o simbólico é cada vez mais importante. Mais importante do que a própria realidade material das coisas. Eu me arrisco a dizer que isso é coisa do passado. É coisa de Baudrillard nos anos 1960. Não de um passado alheio à nossa realidade atual, mas um passado do qual somos consequência direta.

Do materialismo moderno ao niilismo nietzchiano nasce o simbólico pós-moderno, a hiperrealidade. Na dialética entre real e o simbólico, buscamos a síntese no futuro. Mas o futuro não é e nem será, pois quando for já será presente.

A síntese do real e do simbólico é o projeto, em direção ao futuro. Talvez um paradigma que só nos daremos conta na próxima síntese. Mas podemos observar já há algum tempo alguns exemplos:

O Lula sendo ovacionado internacionalmente pelo Fome Zero desde o seu primeiro dia de governo - um projeto, apenas (?) um projeto. O Brasil, a Índia, a China e a Rússia ganham poder internacional, porque são países-projeto e não por demonstrações de poder.

A política, no sentido de vida pública, sempre foi, nem mais nem menos, do que projetos. O FHC foi eleito porque o plano Real estava em prática; o Fernandinho I caiu porque suas realizações não foram boas, e não haveria projeto que o salvasse.

Talvez pudéssemos encontrar um paralelo no cristianismo onde a fé redime os pecados; na política, que o projeto redima as realizações. Mas não é assim. O projeto engaja realizações e é por isso que Barack ganhou o Nobel. Não é um prêmio, não é um voto de confiança, é um engajamento ao seu projeto.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Existencialismo e política 1: Nakagawa e política brasileira

Não são os políticos japoneses que, tal como o ex-ministro das finanças (Shoichi Nakagawa) fez no início deste mês, se suicidam. É a sociedade japonesa que os suicida, ao negar-lhes qualquer possibilidade futura de existência política.

Isso tira a liberdade do político? Anula o existencialismo pela raiz?

Por óbvio, não. há infinitos futuros positivos potenciais fora da política. Mas fora da política ele não quis. Realizou, pois, a sua liberdade e seu projeto, na negatividade total do mundo externo.

Assumiu com coragem e fidelidade o seu fim: quanto menos, foi virtuoso e expiou o erro cometido. Erro ao seu ver, uma moral que é fruto de sua liberdade.


Collor pensou em suicídio. Não sou telepata, ouvi numa entrevista sua. O congresso na época, a sociedade, a Veja e a Globo quase o suicidaram. Mas somos muito pacíficos, e Fernandinho é brasileiro, não desiste.

ACM deve ter tido banda de música no inferno, como quando o receberam na Bahia depois de renunciar à sua cadeira no Senado. Brasileiro como nós, brasileiro que não gosta de suicídios.

Mas calma: os nossos políticos não são japoneses. Aqui, há vida fora da política. Antônio Britto que o diga.